sábado, maio 30

Visão

As chamas que tentam invadir meu coração não podem me separar de ti. A doença que tenta tomar meu espírito não pode me fazer esquecer que tu esteves aqui. A marca que tu me deixaste, vou guardar até que passe esse tempo encoberto onde minha visão tateia no escuro sem definir a superfície que dá forma à tua face. E, estando aqui, o que me resta senão te procurar, ansiar por ti até que meu fôlego se acabe?
Não me distraia essa falsa luz que enche o mundo de infinitos detalhes que só nos fazem perder em ramificações de ramificações! Não se incline o meu coração à essas difusões; redemoinhos de cores sedutoras e falsas que formam a máscara do abismo. Que meu estro não se distraia, mas que se concentre em ti. No teu cerne. Na tua face.

quinta-feira, maio 21

Voz

No mais profundo esconderijo das águas que pairam no céu eu quero estar contigo. O anseio que eu sinto de te encontrar está acorrentado à um infinito que nesse mundo se chama tempo. Eu quero estar longe desse tempo, desse lugar. Quero estar em ti, quero que tu estejas em mim. O mundo é mau, o mundo me queima. Tenta me afogar com o espaço, me apagar com o tempo. Mas eu ainda tenho um restinho de voz, e vou enviar ela até ti, até o teu ouvido. Tu me escuta? Eu não consigo mais te escutar. A areia que escorre do tempo me enterrou e amorteceu a nossa conexão. A ilusão do espaço me cegou e fez com que eu me perdesse nesse labirinto.
Eu quero te encontrar novamente. Eu me lembro de ti. E o que eu sinto por ti não existe na minha memória, mas no íntimo do meu coração, que está longe, muito longe dessa sucessão de dias que me sequestram enquanto estou acordado. E eu declaro guerra. Vou romper com o tempo. Romper com o espaço. Nem a música das estrelas, nem a sutileza da inteligência angélica vão me seduzir. Vou me desprender e voar àonde tu estás.

sábado, maio 9

A Vicissitude

A cada momento eu canso de esperar. Perco a esperança do fato de tu ainda teres esperança em mim. Perco a visão do invisível. Do princípio que separa o céu da terra. Meu âmago vira uma matéria informe e é vomitado como uma massa densa e escura, que, se olhar bem de perto se encontra o que é quase nada.
A cada momento me achego à beira do abismo, e me assusto. Lá estão as trevas. As trevas que um dia pairavam sobre ele, quando eu ainda não te conhecia, e tu já te inclinavas sobre a superfície do oceano no qual eu ainda estou mergulhado.
Eu te suplico, palácio da eternidade, que me desprendais dos laços do tempo, e que, ao cruzar os teus portais, tu me libertes da carne que eu carrego; pois turva é minha visão do céu enquanto ainda estiver acorrentado à terra. Eu anseio pelo teu reino, imerso em luz verdadeira, luz sem sombra.
Mas onde estás? Se estivesses em outro lugar não seria céu, seria terra. Tu estás aqui! Tu habitas aqui! Por que eu anseio tanto pelo não aqui? Onde eu estou? Quando estou aqui, onde tu estás, eu vivo; mas quando estou aqui, onde tu não estás, eu espreito esse abismo escuro, que é a morte.
Mas, ao contrário, ao contrário, ao contrário, quando a face do abismo for selada, quando este momento já passou, chegará a hora sem mais momentos, mas sim, o que no princípio foi pronunciado, e que perdura longe do tempo, no momento da eternidade.

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